Para começar bem a semana, aqui ficam fragmentos de um poema de Novalis, poeta de que tanto gosto:
(...)
Teremos de assumir sempre um tom grave?
Quem for demasiado velho para sonhar,
que evite os encontros de jovens.
(...)
As cores da vida:
quanto mais vivas, melhor.
in Fragmentos são Sementes, Novalis, Roma Editora
Às vezes somos o que somos
Às vezes somos quem fomos
Mas às vezes tantas vezes
Fomos
Aquilo que nunca somos
Somos e fomos por um dia
E às vezes por fantasia
Se perturba tanto, ser ...
Querendo ser o que somos
E aquilo que nunca fomos
Fomos tudo
Somos nada
Fomos aquilo que somos
E às vezes e quantas vezes
Tantas vezes a dizer
Nunca sabemos quem fomos
E nunca soubemos ser
in Poemas com Sabor a Sol a Sal e A-mar, Isabel R. Monteiro, Edições Esgotadas
Um quadro do Diogo Guerra Pinto e um poema de Novalis para descansar o olhar e renovar o espírito neste day after:
Todas as barreiras só existem
para serem ultrapassadas
- e assim por diante.
Deixo aqui um fragmento de um poema de Isabel R.Monteiro, do seu livro Mãe Sem Fronteiras, para falar do lançamento do novo livro de poesia amanhã, pelas 18h, no Museu da Música (estação de Metro Alto dos Moinhos). Gosto muito da simplicidade, emoção e depuração da escrita de Isabel R. Monteiro e a universalidade da sua poesia diz-me muito. Embora não a conheça pessoalmente, gostava de não faltar a este lançamento. O Mário Zambujal vai apresentar o novo livro, que tem um título sugestivo: Poemas com sabor a sol, a sal, A-mar.
O LIVRO E O DESTINO DAS CASAS
A história abriu o livro de todos os assombros
e desceu à rua para perguntar de que cor
é a luz que ilumina as praças, que incendeia as vozes.
Nunca esse livro se abrira assim, tão ousado e grave,
muito antes de se conhecer a palavra fim.
Este livro sobreviveu às labaredas de Alexandria,
aos holocaustos da palavra e do corpo,
ao terror dos meninos nas caves sem pão,
nos escombros do inferno da noite,
à fúria dos algozes e dos inquisidores,
às chamas vorazes de todos os autos-de-fé.
Por isso é um livro único como únicas são
as grandes palavras comovidas
que não sabemos usar quando queremos falar
do sono dos filhos, dos netos, de todos
aqueles que amamos por serem o conforto da alma
agora e na hora dos nossos medos.
O livro está aberto à nossa frente
mas apressa-se a avisar que não tem resposta
para nenhuma das perguntas
que, em sobressalto, nos queimam a boca.
É um livro autêntico e límpido
como as águas dos rios que correm em nós.
É um livro valente e sábio. É um livro feito
à medida dos mapas onde a história se escreve,
mas nada sabe sobre o que está para vir.
É somente um livro aberto,
com pétalas, conchas e lágrimas de chuva,
com o ladrar nocturno dos cães
enrodilhados de frio na soleira das portas.
E é então que a mão vira a página
e pousa numa frase intrigante,
num verso de métrica esquiva,
pedindo à história, sem timbre de súplica:
“Deixa-me falar por ti na hora
em que a serenidade voltar às nossas casas”
José Jorge Letria
Agradeço à minha querida editora Maria João Lourenço o envio deste poema, hoje.
Deixa que a respiração profunda
do teu Ser aconteça. Só isso. Não
interrogues, nem busques. Deixa
que seja Deus a procurar-te. Não
caminhes. Ele virá ao teu encontro.
Não procures contemplar. Permite,
antes, que Deus te contemple. Não
rezes. Deixa que, em silêncio, Ele
reze o que tu és.
in Um Deus que Dança, José Tolentino Mendonça
Estive com o Mia Couto na Feira do Livro e vamos voltar a ver-nos no próximo domingo, dia 15, o último dia da Feira em que ambos estaremos no mesmo perímetro do espaço LeYa, a dar autógrafos. Comprei o seu último livro, Tradutor de Chuvas, e ele escreveu-me mais uma dedicatória maravilhosa. Adoro o Mia e ele sabe. A Patrícia também, pois tanto gosto de um como de outro!
Um lenço branco
apaga o céu.
A fala da asa
vai traduzindo chuvas:
não há adeus
no idioma das aves.
O mundo voa
e apenas o poeta
faz companhia ao chão.
Todas as barreiras só existem
para serem ultrapassadas
- e assim por diante.
in Fragmentos são Sementes
Roma Editora
Para mim o Dia Mundial da Poesia já começou esta noite, com um serão extraordinário organizado por Tolentino de Mendonça na Capela do Rato. Tolentino convidou o actor Luís Miguel Cintra a dizer em alto todo o livro do Cântico dos Cânticos. Foi um momento exaltante para todos os presentes. Associar a voz de Cintra àquele que é considerado o texto mais sagrado dos Textos Sagrados foi de mestre. Estas imagens foram tiradas antes da performance, quando Cintra estava a testar a voz, de costas para a pintura de Lourdes de Castro, um dos quatro artistas plásticos que foram desafiados por Tolentino a criar uma obra para a Capela do Rato.
Entre os testes de som e a falta de luzes, houve algumas hesitações. Cintra precisava de mais luz a incidir nos textos, mas Tolentino não podia prescindir do holofote apontado à pintura de Lourdes de Castro e, por isso, tentou improvisar mais luz com um candeeiro de pé que não fazia raccord com a cena (nem era daquele filme) e rapidamente pôs a ideia de lado. Sem candeeiro mas cheio de inspiração, Luís Miguel Cintra esteve no seu melhor e leu todo o Cântico dos Cânticos para uma plateia a transbordar.
Como disse no início Tolentino de Mendonça, este é o texto central da imensa biblioteca que é a Bíblia, mas permanece como um texto quase clandestino, devido à sua natureza erótica, às palavras mais carnais e à expressão do desejo dos que se amam e se querem próximos. Este "texto reservado", nas palavras do padre Tolentino, só aparece uma vez na leitura contínua da Bíblia que se faz ao longo do ano nas missas, mas é um texto que exerce um fascínio antigo na mística judaica e na mística cristã. Em todo o caso podemos dizer que o Cântico dos Cânticos é um texto quase clandestino, ou reservado, mas nunca proibido. Tolentino de Mendonça fala de reserva e clandestinidade no sentido de um texto que esconde Deus dentro de si e, ao mesmo tempo, O revela através de si. O serão foi um momento alto e este dia da Poesia que, para mim, começou no Rato, só acaba à noite em Belém, numa tertúlia de poetas, cantores, músicos e intelectuais portugueses que mais uma vez celebram a poesia em círculo alargado com o casal presidencial, a convite de Maria Cavaco Silva. No ano passado esta tertúlia foi um acontecimento cultural marcante e tudo me diz que este ano a iniciativa vai ter um impacto igual ou maior. Que bom haver espaço para a cultura nacional e ouvir poetas e cantores no lugar onde habitualmente falam os políticos.
O Tesouro Escondido, o novo livro de Tolentino de Mendonça, está em primeiro lugar no top de vendas de algumas livrarias de referência. Grande pinta. Tenho-o à cabeceira e confesso que demoro a ler cada página, pois cada parágrafo é em si mesmo um tesouro. Deixo aqui algumas frases, mais ou menos avulsas, que dão que pensar. Gosto do silêncio e quem me conhece ou acompanha sabe que o cultivo em Exercícios Espirituais e não só. Talvez por isso tenha escolhido estes fragmentos:
Uma árvore é uma semente que cresce devagar e em silêncio.
Ama o silêncio acima de todas as coisas; ele concede-te um fruto que à língua é impossível descrever... Dentro do nosso silêncio nasce alguma coisa que nos atrai ao silêncio.
Os nossos sentidos espirituais abrem-se e maturam melhor no silêncio.
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