Terça-feira, 20 de Maio de 2008
Às terças na Luz

 

Estas são as escadas que subo e desço invariavelmente no Hospital da Luz  todas as terças à tarde. Sou voluntária no Piso 4, na Unidade de Cuidados Paliativos, e se mostro as escadas rolantes é só porque me são familiares e porque, como é óbvio, não faz sentido revelar aqui a intimidade dos quartos.

 

Percebi a importância de uma Unidade de Cuidados Paliativos quando estive à cabeceira de alguém muito querido, que morreu demasiado cedo. Realizei então a diferença abissal que existe no acolhimento e tratamento dos doentes terminais nos hospitais que têm e não têm equipas especializadas em Cuidados Paliativos. Falo de um abismo muito fundo e muito doloroso para os doentes e para as suas famílias, note-se.

 

Decidi tornar-me voluntária quando a Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos fez o primeiro curso de voluntariado, no Verão passado. Não tive dúvidas de que queria fazer o curso, mas tive dúvidas sobre se seria capaz de estar semanalmente à cabeceira de doentes crónicos e terminais.

 

Ao fim de oito meses posso dizer que não só sou capaz, como descobri que gosto e que esta forma de voluntariado dá muito mais vida à minha própria vida. 

Haja o que houver, aconteça o que acontecer, as tardes de terça passadas no hospital são sempre as tardes mais importantes da semana. De todas as semanas, quero dizer.

 

Explicar aqui a essência da vida vivida naquela Unidade é uma impossibilidade física. É extraordinariamente difícil traduzir por palavras ditas ou escritas tudo o que se diz, tudo o que se cala e tudo o que se sente naquelas horas que passamos uns com os outros nos quartos e corredores do hospital. 

A mim basta-me o duplo sentido que dou à expressão "vou à Luz!". 

 

publicado por Laurinda Alves às 21:27
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7 comentários:
De padeiradealjubarrota a 20 de Maio de 2008 às 22:15
Então o Hospital da Luz é um desses sítios com cuidados paliativos? E em que constam esses cuidados? Quando já não se justificam tratamentos cruéis... o que fazem? E os doentes conseguem mesmo não ter dores? E as dores psicológicas? De que falam com esses doentes? E como se acompanham os que desistem de falar?...
Morrer de mão dada, já é no mínimo um conforto.
De joseph a 20 de Maio de 2008 às 23:09
dizem que o voluntariado (e a generosidade) aumenta a gratificação com a vida.

mas este voluntariado a que a Laurinda se refere deve ser complicado. não lhe transmite angústias ou emoções negativas ao fim de algum tempo??

De Eu:) a 21 de Maio de 2008 às 00:33
Olá:)
Foi com grande agrado que por mero acaso descobri este blog! Fiquei maravilhada e ao mesmo tempo desapontada, comigo mesma, por nunca me ter lembrado que um blog Seu poderia existir.
Antes demais, quero dizer-lhe que adoro a crónicas que escreve, são um alento para a alma e uma inspiração para vida... comecei a lê-las cedo, na revista "XIs". Todas as semanas lá estava eu ansiosa, por rir ou chorar, com o que iria ler na revista! Quando a revista terminou acabei por lhe "perder o rasto"...
Fico feliz por ter descoberto este "cantinho" e de certo que cá voltarei diariamente!
Obrigada pelas palavras que partilha com todos os seus leitores:)
Um beijinho
Susana F.
De ruben a 21 de Maio de 2008 às 01:59
é uma dádiva poder partilhar as suas vivências neste blog. estou sem palavras. eu sei que a eutanásia é para muitos um acto de compaixão mas os cuidados paliativos são um acto transcendente que muitos "ainda" não conseguem sentir e entender e eu falo por mim. a Luz não é de acesso fácil e cómodo, nem conhece atalhos.
De Augusto Küttner de Magalhães a 21 de Maio de 2008 às 10:13
Felicito-a pelo seu trabalho - já conhecido e empenhado - nesta área e em mais de caracter humanitário e de verdadeira solidariedade desinteressada.
De ana a 21 de Maio de 2008 às 12:10
Bem faço minhas as palavras de EU Susana F. pois foi exactamente o q me aconteceu. Identifico-me desde as crónicas até ao nunca me ter passado pela cabeça o facto da Laurinda ter um blog... Se calhar estou mais pronta agora para o acolher e "reencontrar-me" q antes. Mas dd já obrigada Laurinda por colocar ao serviço dos outros os vários talentos q tem, especialmente o da palavra, q vindo de si, a mim particularmente, faz-me sp companhia, ou pq me resgata no meu intímo, ou pq me leva ao encontro de algo q me faz bem conhecer. E no fio condutor da palavra, existem outros dons, q acredito, tornarem-se instrumentos de alerta para os outros, do tão pouco q poderemos fazer tornando-se mais.
Obrigada Laurinda, por esse compromisso tão genuínamente livre de ser, de estar
Ana R.
De Maria Sousa Coutinho a 27 de Junho de 2012 às 12:17
Estimada Laurinda, como faço para ser voluntaria np hospital da luz nos cuidados paliativos? é necessario fazer algum curso? O que deverei fazer e onde me devo dirigir? obrigada MSC

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