Quarta-feira, 7 de Janeiro de 2009
Improviso de Schubert e vento lá fora

 

Adoro as horas de estudo de piano e as rotinas diárias de

uma casa vivida onde cada coisa tem o seu lugar, cada um

tem o seu espaço e as coisas acontecem com naturalidade.

Às vezes fico calada de frente para as minhas janelas a ouvir

os sons cá dentro e os barulhos lá fora. Ou a acompanhar o

voo das gaivotas e o movimento das pessoas ao fundo, nas

ruas de degraus de pedra. Gosto da vida das cidades e de ver como

as coisas acontecem. Fascinam-me os detalhes e prendem-me os

gestos. Ouço frases que foram ditas e ficam a fazer eco como se as

ouvisse de novo. Gosto deste secreto poder da memória, quando traz

de volta alguém ou alguma coisa que apetece reviver. Nos dias mais

difíceis, como estes que agora estamos a atravessar, fico mais calada 

e contemplativa. Pergunto-me os 'porquês' e 'para quês' das coisas. Não

encontro respostas evidentes mas apenas pistas, chaves de leitura que

permitem acreditar que um dia tudo ficará muito mais claro. Alguém me

ensinou a viver 'ao terceiro dia' (como nas Escrituras), dando tempo ao

tempo, esperando que certas coisas voltem a fazer sentido, acreditando

que o melhor está sempre para acontecer. Acredito nisso. E por isso não

desanimo. E volto às minhas janelas onde há sempre alguma coisa que

me reconcilia com a vida. Desta vez foi o vestido pendurado pela Mena na

corda da roupa. Dou-me conta de que é aquele vestido especial, e fico ali

a vê-lo dançar ao vento lá fora, quase ao mesmo ritmo de um Improviso de

Schubert cá dentro. Não resisto a filmar esta cena meio-felliniana. Aqui fica. 

 

 

publicado por Laurinda Alves às 01:40
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26 comentários:
De padeiradealjubarrota a 7 de Janeiro de 2009 às 01:56
São pequenos nadas que são absolutamente tudo. Chama-se sensibilidade. Boa noite com sonhos azuis...
De bibabalula a 7 de Janeiro de 2009 às 02:20
Boa noite Laurinda ou será melhor dizer Bom dia!
Que post tão sentido, tão intimo, tal como um desabafo que mais uma vez compartilha connosco.
Sabe eu adoro "sentir" todos os ritmos e sons da cidade. Hoje, ao andar em direcção a um supermercado e, como mesmo ao pé ouvia-se o som de umas obras, que continha diferentes tons, volumes e ritmos, dei comigo a emitir, em surdina, esses mesmos sons como que a compor uma música, de tal forma que, quando me apercebi do que estava a fazer, sorri e acredite senti-me muito mais bem disposta.
Claro que isto não passou de um momento que se atravessou no meu caminho, pois se eu estivesse nesse prédio, ou perto, por um período mais longo, com certeza que a minha reacção não seria a mesma, mas sim de desespero.
Mas a vida não é feita do somatório de pequenos momentos?
Quanto ao video que nos presenteia é um autêntico espectáculo. Primeiro porque a música é linda e depois porque o seu vestido parece que lhe quis oferecer realmente qualquer coisa especial para que fizesse fazer as pazes com a vida e de que forma!
Não é que o vestido ao deslocar-se e movimentar-se acompanha os diversos compassos de Shubert?
Acredite Laurinda que estas coisas não acontecem por mero acaso. Foi Deus que lhe pôs no seu caminho, hoje, porque a Laurinda precisava, algo para suavisar e ajudá-la a viver o dificil momento que está a atravessar.
Espero que a sua mãe esteja a sentir-se um pouco melhor, com menos dores e desejo-lhe as melhoras.
E para si um grande abraço cheio de força e coragem.
De J a 7 de Janeiro de 2009 às 03:15
Li e voltei a ler para entender, ouvi e voltei a escutar, vi e voltei a contemplar. A forma como olhamos as coisas nem sempre é a mesma ou nem sempre é vivida com a mesma intensidade ou compreensão.
Cumprimentos
De VIGUILHERME a 7 de Janeiro de 2009 às 07:21
Estes seus textos de Ano Novo ,são meditações/reflexões/soliloquios (silêncios falados/dialogos dentro de si/falando alto sozinho consigo)......... são belos /sabios textos ......

Desejo e partilho consigo com afecto as rapidas melhoras e restabelecimento de sua mãe ,como a chegada de um Novo Ano com a esperança de um Mundo cada vez melhor nos seus valores Humanos e da Natureza .....
De Vera Baeta Lima a 7 de Janeiro de 2009 às 08:31
Lindo vestido :-)
Lindo filme :-)
Lindo post :-)
Bjs
De flor a 7 de Janeiro de 2009 às 08:33
Também eu aprendi com a Laurinda a esperarpelo 3º dia...e tem resultado! Desejo que goze com serenidade essa espera!Bom dia!
De Zilda Cardoso a 7 de Janeiro de 2009 às 08:47
Está tão bom o seu texto, tão bom!
Fez-me muito bem lê-lo, aprendi coisas importantes, coisas de nada. Que não são de nada, mas da vida, da vida que estamos a viver. Da vida que estamos a enriquecer com o nosso pensamento, com o n/ esforço, a n/ vontade, a n/ sensibilidade, o n/ amor por ela.
Reencontraremos os sentidos das coisas, sem dúvida.
De Nucha a 7 de Janeiro de 2009 às 08:50
Muito bom...felliniano mesmo...
Espero que a sua mãe esteja melhor...
Um Abraço!
De Telma a 7 de Janeiro de 2009 às 09:51
Adorei este post Laurinda. E estou certa que tudo acontece no devido tempo tal como as notas de música ouvidas no seu video. Um beijinho especial.
De Augusto Küttner de Magalhães a 7 de Janeiro de 2009 às 11:44
Este post é daqueles que temos que ler/ reler, dado ter tanto conteúdo, dado fazer-nos pensar na vida, como é vivida, como tem que ser vivida, o que estamos hoje a sentir, e o que esperamos - sempre de melhor - amanhã poder/querer/ ter que viver! Bom, este post!

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