Segunda-feira, 14 de Julho de 2008
Ninguém quer ver o insuportável

O caso Fritzl abalou o mundo mas infelizmente não foi o único. Logo a seguir, em França descobriu-se outro pai que mantinha o mesmo tipo de relação com a sua filha Elizabeth, de quem também teve filhos, embora o sequestro fosse 'apenas' psicológico e emocional.

 

Ponho aspas na palavra 'apenas' porque o terror de viver sequestrada moral ou emocionalmente pode ser tão brutal como o sequestro físico vivido pela filha de Fritzl e filhos. Quando nos interrogamos sobre os cúmplices destas e outras histórias, percebemos que é improvável que outros não estejam envolvidos.

 

Hoje o Público traz a notícia de um casal alemão que foi condenado por ter deixado a sua filha morrer à fome. Lea-Sophie tinha cinco anos e pesava 7 quilos. É impossível que outros não tivessem reparado numa criança esquelética que estava literalmente a morrer à fome.

 

Uma semana antes de Lea-Sophie morrer os serviços alemães de protecção de menores foram anonimamente contactados e investigaram o apartamento do casal (Nicole, 24 anos e Stefan, 26 anos tinham dois filhos) mas o casal apresentou apenas o filho e escondeu a filha. É extraordinário que os agentes não tenham exigido ver a criança que procuravam mas compete agora às autoridades alemãs investigar estes investigadores.

 

Se falo disto é porque todos sabemos que há sempre mais cúmplices do que aqueles de quem se fala. A mulher de Fritzl nunca desconfiou? Ou era, também ela, violentada e mantida num clima de terror psicológico? E os vizinhos? E o resto da família? E as autoridades?

 

É incrível como estas coisas se passam tão perto de nós, na porta ao lado, na rua da frente ou no prédio de trás, em cidades como a deste casal de Schwerin, perto de Berlim, e é incrível como aparentemente ninguém quer ver o insuportável. Dizem os especialistas que na raíz desta cegueira colectiva está o medo de sermos obrigados a ser consequentes e a agir em conformidade, implicando-nos de alguma forma em casos que nos são insuportáveis. Será?

 

publicado por Laurinda Alves às 18:50
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3 comentários:
De jc a 17 de Julho de 2008 às 19:42
houve um caso há pouco tempo em que um emigrante português denunciou um caso de pedofilia e em consequência da boa acção foi despedido.
muito mal comparado, a anterior gestora do mnaa denunciou o estado de degradação e má gestão do que deveria ser o maior museu português, reparou o mal e em consequência foi despedida.
o meu local de trabalho foi assaltado pela segunda vez este mês por filhos dos utentes, que foram apanhados em flagrante.
os utentes, com quem construímos uma relação de confiança frágil durante os passados dois anos, passaram de repente a olhar para nós como chibos, apesar de não haver nenhuma ponta de responsabilidade nossa na acção dos filhos. as autoridades levaram os miúdos para o posto, onde lhes fizeram o que bem entenderam sem nunca chamarem os pais. um foi levado a casa depois e o outro foi mandado a pé.
neste momento, o trabalho que fazemos está em sério risco de falhar.
acha mesmo que quem não tem competências formalmente atribuídas para um determinado procedimento, apesar de as poder ter informalmente, deverá fazer o trabalho que formalmente compete a outros?
ou serão esses outros que precisam de ser chamados a fazer o seu?
De Isa a 17 de Julho de 2008 às 20:15
Neste preciso momento tenho conhecimento de duas situações de violencia psicologica muito grave sobre uma jovem de 15 anos por parte do padrasto, que se passeia em casa de arma na mão e lhe dá castigos humilhantes e uma outra jovem e o seu írmão que são vitimas de violencia na Instituição que os acolheu e com a conivencia dos tecnicos.
Não há lares onde acolher estes jovens, uma denuncia formal vai agravar a situação que vivem... a própria policia já foi contactada e desmobilizou a jovem de apresentar queixa... as equipas de menores em risco rebentam pelas costuras e não têm os meios de que carecem para poder de facto intervir!!!! ( e fazem tantas vezes esforços heroicos ... )
Urge criar respostas seguras e de qualidade que permitam que as situações sejam denunciadas ! Não há respostas em Portugal que sejam suficientes !
Não estou a dizer que relativamente as situações que referi não esteja a ser feito nada mas quero poder acreditar que o desfecho vai ser o que estas crianças de facto merecem !
De Concha a 17 de Julho de 2008 às 20:43
É curioso , porque há uma grande atracção por tudo o que diga respeito aos outros . Numa conversa na esquina da rua ,que até pode começar com o trivial , a maior parte das vezes desenvolve-se comentando a vida dos outros .A vida destes que tanto interesse tem para nós , ao ponto de lhes dedicarmos tanto do nosso tempo . Quando se trata de assumirmos uma atitude altruísta , de os ajudar nas dificuldades da vida é vulgar começarem a aparecer os egoísmos e os medos .Egoísmos em relação aos mais próximos e medos em relação aos outros . Sempre o receio de agir pensando logo nas consequências futuras . Por outro lado há também uma tendência a não se depender em nada dos outros e isso repercute-se de modo a acharmos que as suas vidas só a eles dizem respeito . Penso que aqui se poderia falar de uma visão egocêntrica das nossas vidas.
Concha

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